quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Como é que uma personagem como Trump chegou à final da corrida presidencial?





Gravei o 3º debate da corrida presidencial americana na Sic Notícias. 
No início do debate o que sobressaiu, a meu ver, foi o profissionalismo dos assessores políticos das campanhas: é obra conseguir treinar Trump, por exemplo, a comportar-se com firmeza controlada. Isto durou cerca de meia hora.
No resto do debate a personalidade de Trump começou a sobrepor-se ao treino cuidadoso a que o tinham sujeito. 
E perto do final Trump espalhou-se ao comprido no tapete: era o K.O.

Alguém que se inscreve numa qualquer corrida tem de aceitar as regras do jogo. Senão pura e simplesmente não deve participar. 
Quando o adversário o ultrapassa quase no final começar a gritar que a corrida está viciada, é ridículo.
Não foi apenas esse momento que determinou o K.O., houve outros, mas esse foi claramente o pior.
Pensar nas horas de trabalho árduo dos treinadores de Trump para o ajudarem a comportar-se e a decorar as respostas às questões principais, e vê-lo desbaratar todo esse esforço, é até risível.

A imagem do final do debate também diz tudo sobre Trump: cumprimenta o jornalista de cima para baixo do palco, mantém-se no palco, a família é que se aproxima dele, rodeando-o, ficando todos em círculo em cima do palco, como um grupo de celebridades. Esta é a imagem que fica.

Hillary desce do palco e aproxima-se das pessoas. O seu rosto é aberto e sorridente. A cor branca do fato ajuda, dá-lhe uma luminosidade afirmativa pacífica. Tudo isto é estudado ao milímetro, nada é deixado ao acaso.

Hoje os bons políticos têm de ser bons actores. Apresentar-se na televisão, informar, afirmar, comunicar. Aguentar a pressão, a crítica, os golpes, e a agressividade. Ir a jogo para ganhar, mas saber lidar com a frustração de perder.



A minha perplexidade nestas eleições presidenciais americanas mantém-se: como é que uma personagem como Trump pode sequer ter chegado à final?

Mesmo contando com (e até precisamente por causa disso):
- a dimensão da revolta dos cidadãos esquecidos, maltratados, excluídos pelo sistema político americano;
- a destruição económica pelo sistema financeiro de indústria, comércio, cidades, empregos, deixando famílias na rua, comunidades desestruturadas;
- a desigualdade impensável e incomportável na distribuição dos rendimentos, dos recursos, do património, do poder e da influência, entre o 1% e os restantes 99%.

Trump apresenta-se como o bilionário que não paga impostos porque é esperto!
Trump construiu o seu império imobiliário com trabalhadores ilegais.
Trump também fez negócios ruinosos deixando para trás edifícios megalómanos abandonados.
Trump, segundo uma investigação do Financial Times, terá ligações a uma rede internacional de lavagem de dinheiro.
Isto não seria mais do que suficiente para afastar os votos dos revoltados?

Será que os outros candidatos republicanos eram assim tão fracos?
Será que o "one man show" e o entretenimento vêm substituir o perfil e a preparação dos políticos?

Só no dia das eleições poderemos saber e compreender um pouco melhor o fenómeno. Mas estas questões são preocupantes.


Sem comentários:

Enviar um comentário