domingo, 28 de maio de 2017

Venezuela, ONU, e a possibilidade de ultrapassar alguns equívocos culturais sobre eleições livres





Inicio com uma provocação sobre os equívocos culturais relativamente às condições básicas de umas quaisquer eleições livres, para depois tentar visualizar possíveis soluções para uma situação de emergência humanitária e a criação de condições favoráveis à realização de eleições na Venezuela.


Alguns equívocos culturais sobre eleições livres:
Umas eleições são consideradas livres
1 - desde que se apresentem dois candidatos, o do governo e o da oposição ao governo, 
2 - e não haja batota na contagem dos votos.

Temos aqui dois equívocos nestas duas condições básicas. Equívocos que levam a pensar que se resolve o assunto com observadores imparciais e já está.


O primeiro equívoco: basta que haja dois candidatos, o do governo e o da oposição.

Para serem livres, umas quaisquer eleições necessitam de condições favoráveis à observação e avaliação das candidaturas, e à reflexão para uma decisão adequada às expectativas dos eleitores.
Considerando estas condições básicas, já temos duas eleições que não as respeitam: a recente, nos Estados Unidos, e as próximas, no Reino Unido.
Nos Estados Unidos, pela apresentação de duas candidaturas indesejadas pela maioria da população. No Reino Unido, pela situação de tensão social pós-Brexit.

Estados Unidos: a apresentação de apenas duas candidaturas a votos parece-me muito fraca para garantir uma escolha abrangente. Pior ainda quando nenhuma responde às expectativas da população: mudança e equilíbrio social.
Reino Unido: programar eleições quando o país vive uma situação de tensão social, uma enorme ansiedade relativamente a um futuro incerto, desconfiança instalada, agressividade xenófoba, parece-me altamente irresponsável.

Ora, muito mais difícil será criar estas condições na Venezuela. É preciso tempo, assegurado por um compromisso entre o governo e a população com a mediação da ONU. Não vejo legitimidade num compromisso governo - oposição.

É precisamente quando há turbulência nas ruas, tensão social, ou mesmo o caos a instalar-se, que aparecem os heróis de circunstância, que captam votos apenas a navegar as ondas de protesto.
Os eleitores têm de ter as condições necessárias para analisar o candidato, o seu percurso, a sua credibilidade, antes de lhe conferir legitimidade.


O segundo equívoco: desde que não haja batota na contagem dos votos.

Antes do processo contagem dos votos, as batotas possíveis podem ter já acontecido: mentiras, boatos, ocultação de informação importante, ausência de transparência, acordos e agendas secretas.
E não vamos mais longe, voltamos aos Estados Unidos. A confusão mediática sobre as relações presidente e os seus próximos - Rússia, vai continuar. E isto podia ter sido evitado com mais exigência relativamente às candidaturas. A responsabilidade é, pois, do partido republicano, do partido democrata e do próprio sistema político.



Quais as condições básicas que garantem que umas quaisquer eleições sejam consideradas hoje, de facto, livres?

- a possibilidade dos eleitores observarem, analisarem, avaliarem os candidatos e as suas agendas;
- as condições favoráveis, tempo e tranquilidade social, a esta reflexão dos eleitores para uma escolha que responda às suas expectativas;
- as candidaturas devem respeitar as regras da democracia: transparência, informação fidedigna, credibilidade, experiência comprovada, equipas de suporte, participação de comunidades, etc.
- o papel da comunicação social, que deve igualmente respeitar as referidas regras democráticas. 
Os media têm servido mais de transmissores acríticos de informação duvidosa, de fugas de informação contraditórias, numa motivação mais financeira do que ética e cívica;
- a abrangência das candidaturas ser suficiente para responder às expectativas da população na sua diversidade, o que permite garantir legitimidade. 
Ora, dificilmente a existência de apenas duas candidaturas que chegam à final, depois de filtradas por um sistema político, podem assegurar esta abrangência, ficando uma grande parte da população sem candidato. Exemplo: muitos jovens que estavam com Bernie Sanders, nas eleições americanas.




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