Al Gore teve de fazer uma travessia do deserto, foi descredibilizado e ridicularizado, e o mundo continuou alegremente a basear a sua economia em indústrias poluentes. Mas ainda pior!, em nome de megalomanias do poder e da finança, o mundo tornou-se um lugar mais perigoso.
Passados 16 anos, o sistema eleitoral americano não tinha melhor para oferecer aos cidadãos do que Trump vs Hillary Clinton? Como é isto possível?
Um candidato à presidência da maior potência mundial não tem de se submeter a uma avaliação psicológica, mental e de personalidade, para se verificar a sua capacidade para o cargo, mental, comportamental, experiência profissional, valores democráticos, respeito pela Constituição? Não há qualquer exigência básica?
Reparem: por muito menos, erros de avaliação psicológica em profissionais de transporte levaram um piloto de uma companhia aérea a dirigir o avião - e as pessoas lá dentro -, contra uma montanha, e um piloto de um comboio de alta velocidade a descarrilar - com as pessoas lá dentro -, ao entrar numa curva acentuada.
Ao ver as notícias da CNN, da Fox, da BBC, da Sky News, até tremo. As lideranças mundiais, de que esperávamos algum bom senso e que nos dessem alguma sensação de segurança, estão em suspense. Algumas até já se dirigiram à torre de Trump - se não fosse um caso tão sério para todos nós até dava um tema para um filme. Algumas lideranças verbalizaram o impensável: Estamos à espera de ver se o Trump presidente é diferente do Trump candidato. A sério? E se o Trump presidente for mesmo o Trump candidato? Têm algum plano B?
É que tudo nos indica que o Trump presidente é mesmo o Trump candidato. E sendo assim, o que falhou? Quais os mecanismos da democracia americana, Constituição, instituições, filtros do poder, dispositivos de segurança básicos, que falharam?
Já tinham falhado com Bush, e vejam o resultado. Agora conseguiram falhar muito mais.
O que falhou:
1 - o sistema eleitoral: a avaliação prévia de cada candidato para se verificar a sua capacidade para o cargo, mental, comportamental, experiência profissional, valores democráticos, respeito pela Constituição. Imagine-se agora o Trump presidente a jurar sobre a Constituição no dia da tomada de posse, depois de ter desrespeitado quase todos os valores constitucionais... Tudo é permitido durante as campanhas, a linguagem, os preconceitos e os bodes expiatórios, o apelo à divisão, a ameaça de deportação e prisão, próprios das culturas fascizóides, e subitamente, depois das eleições, a imagem é limpa e surge imaculada na torre com o seu nome. A equipa que rodeia o eleito é toda constituída por "a good guy", "a good person". E o mundo em suspense...;
2 - o sistema político: os eleitores só têm duas opções de escolha, dois únicos partidos, duas únicas cores, vermelho e azul. O sistema está encriptado, fossilizado, fechado a uma terceira escolha. E mesmo nas duas únicas opções chega ao final quem tem mais recursos: exposição mediática, apoios influentes, etc. Foi assim com Hillary vs Bernie nas Primárias, deixando os jovens sem candidato;
3 - a cultura americana: o que é promovido nos media?, a quem se dá voz? Às elites, a celebridades, a megalómanos, a uma cultura narcísica, a uma minoria de pessoas e de interesses. Falta descodificar as agendas das elites e desmontar a desinformação. Falta dar voz aos grupos representativos das diversas regiões, dos milhões de cidadãos esquecidos pelo sistema político e financeiro. Senão, o que é que acontece? A raiva e a revolta leva-os a votar emocionalmente. O trágico é que votaram, dentro das duas únicas opções, no seu pior inimigo.
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