segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

A imprevisibilidade própria das sociedades livres

A imprevisibilidade própria das sociedades livres tornou-se o principal obstáculo ao controle dos cidadãos. E a tendência actual é precisamente tornar previsível o seu comportamento. A recolha de dados dos cidadãos vai também nesse sentido. Hoje já é possível prever com algum grau de segurança (a tão repetida margem de erro das sondagens) qual a resposta de grupos de indivíduos. Hoje já é possível identificar grupos problemáticos e antecipar os seus movimentos e iniciativas.

As sociedades mais saudáveis são as que se organizaram dando espaço a um certo grau de liberdade individual e grupal. Aparentemente caóticas quando observadas à distância, a sua organização é flexível, aberta, mutável, tal como a própria vida e as suas leis: equilíbrio e movimento.
Esta organização não é nova na história, muitas civilizações terão florescido assim, procurando aproveitar os recursos existentes de forma razoável e equilibrada.

Mas também vemos na história civilizações que se organizaram apropriando-se dos recursos de forma ávida e gananciosa, e esgotando-os rapidamente. É o que se verifica também actualmente: sorver tudo sem critério a não ser o enriquecimento corporativo.
Para manter a ordem num tal desequilíbrio torna-se necessário neutralizar toda a margem de erro que possa surgir nas iniciativas sociais. Também é preciso manter a ilusão da liberdade e da cidadania. E igualmente entreter e alienar.

Quais os grupos que se adaptarão melhor a uma sociedade controlada e onde o comportamento social se tornou previsível? Precisamente os que não convivem bem com a imprevisibilidade própria das sociedades livres. Os que propõem uma ordem imposta de cima, os que idealizam e admiram os poderosos, os que apreciam a lei do mais forte, os que se renderam à cultura do objecto. Todos os extremos se encontram aqui, da direita e da esquerda, mas também os pueris. Nada como uma ordem exterior para aquietar o caos interior (extremismos) e o vazio interior (pueris). Paradoxalmente, também os revoltados se adaptarão razoavelmente, afinal este é um duelo a que se habituaram. Os rebeldes encontrarão aqui uma missão que será duradoura para os que se viciaram na própria revolta, e temporária para os que evoluíram para a autonomia responsável do adulto.

Quais os grupos que não se adaptarão facilmente? Todos os que observam o mundo com a consciência do adulto responsável. Serão estes os que perceberão mais cedo o que os espera e a todos os que ficarão submetidos a tal organização social. As iniciativas criativas e imprevisíveis surgirão daqui. Contrariamente aos grupos de revoltados e rebeldes, as suas iniciativas serão sempre responsáveis e pacíficas, o seu objectivo será sempre a defesa do mais fraco e vulnerável, a qualidade de vida, a dignidade.

O paradoxo essencial e não visível aos olhos do poder que controla tudo e todos: 
- no caos aparente de organizações onde todos têm um papel activo e onde tudo é negociável, encontramos uma organização que permite a qualidade de vida e o convívio pacífico; 
- na ordem aparente de organizações fortemente controladas, encontramos focos de revolta que implicam a utilização de meios de segurança, vigilância e encarceramento.





As leis comuns a todas as formas de vida são as mesmas para as organizações sociais. Seria muito útil para todos nós que esta mensagem fosse percebida, até porque a história nos revela isso mesmo:

- a vitalidade e criatividade, nunca tão necessárias como agora para lidar com os desafios actuais, está do lado da organização mais livre, aberta e flexível;
- o equilíbrio e movimento das sociedades que dão espaço à imprevisibilidade permite, paradoxalmente, que evoluam de forma saudável e pacífica;
- numa organização inteligente, isto é, que segue as leis gerais da vida (equilíbrio e movimento), os recursos são aproveitados e distribuídos de forma razoável, tornando-a gratificante para todos, isto é, todos ganham.




    

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